segunda-feira, 24 de setembro de 2012

O ALUNO COM DEFICIÊNCIA FÍSICA NEUROMOTORA



O direito de acesso à educação é de todos. O compromisso de atender às inúmeras diferenças que se apresentam no processo de ensino e aprendizagem é de todos os envolvidos com a educação, a partir do momento em que as diferenças são identificadas, reconhecidas e valorizadas na prática pedagógica da escola, em busca de alternativas de ensino e aprendizagem.
Para atender estas diferenças faz-se necessário conhecer o aluno.
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação, em seu artigo 59, do capítulo V, prevê que os sistemas de ensino deverão assegurar currículos, métodos, técnicas, recursos educativos e organizações específicas para atender às necessidades dos alunos.  
O acesso ao currículo implica em conhecer o aluno, reconhecer suas capacidades, para então prover as condições que possibilitem sua participação efetiva no processo de ensino e aprendizagem.
De acordo com o antropólogo Claude Lévi-Strauss (apud BRASIL, 2002, p.13), “as diferenças existem, devem ser reconhecidas e assumidas e não escondidas. Somos natural e biologicamente diferentes. Isso não quer dizer que, necessariamente, devamos ser desiguais. Diferença e desigualdade não são a mesma coisa”.
Estas palavras nos remetem a uma reflexão em torno das diferenças existentes entre as pessoas, que vão além de uma simples diferença física, como a cor de cabelo, dos olhos, entre outras. Estamos falando das diferenças individuais, que destoam do padrão de normalidade e que devem ser consideradas, pois é em função delas que o aluno com uma deficiência física neuromotora requer condições diferenciadas para a sua aprendizagem. Essas condições se diversificam na complexidade das variações de caracterização e tipologia da deficiência física, sendo necessária a identificação e o reconhecimento das especificidades de cada aluno.
A seguir, serão apresentadas as diferenças expressas pelo aluno, que é acometido por quadros patológicos no ambiente escolar, cujas sequelas trazidas por elas demandam um olhar díspar, demudado, aguçado e, principalmente aberto às inovações pedagógicas.
O pressuposto conceitual e didático de Wilson (1971) aponta três categorias que classificam a deficiência física, descritas no quadro:
CATEGORIA DE CLASSIFICAÇÃO
DEFICIÊNCIAS MUSCULARES E/OU NEEUROMUSCULARES
DEFORMAÇÕES
ÓSSEAS
LIMITAÇÕES DO VIGOR, DA VITALIDADE E/OU DA AGILIDADE

Sendo assim, os alunos com deficiência física neuromotora apresentam comprometimentos diversos, decorrentes das patologias acometidas. Em consequência da causa e do grau de abrangência deste comprometimento, pode ser afetado o desenvolvimento motor, limitando o andar, a coordenação de braços, pernas e da fala. Os comprometimentos são resultantes de problemas ortopédicos, neurológicos, musculares ou de má-formação congênita - nasce com ela, ou a adquire - causadas por acidentes, medicamentos e/ou infecções (BRASIL, 2000).
            O termo neuromotora utilizado neste texto reporta-se

às deficiências cujas manifestações exteriores consistem em fraqueza muscular, paralisia ou falta de coordenação, geralmente são designadas mais apropriadamente como neuro-musculares, uma vez que as dificuldades encontram-se mais frequentemente nos centros e vias nervosas que comandam os músculos, do que nos músculos em si. Lesões nervosas podem ser causadas por infecções ou por lesões ocorridas em qualquer fase da vida da pessoa, podendo também ocorrer por uma degeneração sem causa aparente (apud BRASIL, 2002, p.19).

            Há inúmeras variedades de patologias e agravos que alteram a motricidade e que são enquadradas na área da deficiência física. Dentre elas, enfocam-se aquelas de maior implicação na aprendizagem e de maior incidência entre os alunos da Educação Básica. Dos quadros motores mais comuns, citamos a sequela de paralisia cerebral, a mielomeningocele, a distrofia muscular progressiva e as lesões medulares.
            A Paralisia Cerebral é a sequela neuromotora mais evidente no ambiente escolar. Para uma melhor compreensão do conceito (clínico), do comprometimento e consequências, recomenda-se a leitura do texto referente à Paralisia Cerebral.
O conceito de deficiência física neuromotora e a relação histórica entre a concepção do modelo clínico, abordado na Educação Especial, para o modelo social e funcional constituem-se em medidas que pretendem valorizar as possibilidades, no intuito de desenvolver as potencialidades do aluno e não suas limitações (ISRAEL; BERTOLDI, 2010).
A abordagem teórico-metodológica será apresentada em dois momentos: acessibilidade física e tecnologia assistiva/comunicação alternativa.

Quanto à acessibilidade física

Muitas são as barreiras a serem transpostas para que o aluno possa ter assegurado o seu direito à educação. Sabemos que a acessibilidade engloba um conjunto de condições que garante esse direito, incluindo desde a adequação de espaço físico (prédio), dos mobiliários (carteira, cadeira, mesa, etc), a aquisição e adaptação de equipamentos (computador), materiais pedagógicos (lápis, caderno, entre outros), até a flexibilização dos procedimentos didático-pedagógicos, (objetivos, conteúdos, metodologia e avaliação), considerando sua comunicação alternativa.
Em relação ao espaço físico, no contexto escolar, há alunos que, para sua locomoção, utilizam-se de cadeira de rodas, muletas, andadores, entre outros e necessitam que os espaços sejam modificados. Visando a sua autonomia e independência, faz-se necessário promover a acessibilidade física, eliminando todas as formas de barreiras que impedem sua participação.
Conforme o Decreto nº. 5.296/2004,

Art. 8º Para fins de acessibilidade considera-se: condição para a utilização, com segurança e autonomia, total ou assistida, dos espaços, mobiliários, equipamentos urbanos, das edificações, dos serviços de transporte e dos dispositivos, sistemas e meios de comunicação e informação, por pessoa portadora de deficiência ou com mobilidade reduzida. (BRASIL, 2004, p.11).

E por barreiras entende-se “qualquer entrave ou obstáculo que limite ou impeça o acesso, a liberdade de movimento e a circulação com segurança e a possibilidade das pessoas se comunicarem ou terem o acesso as informações. (BRASIL, 2004, p.11).

Quanto à comunicação  

A proposta de comunicação alternativa tem como pressuposto básico a promoção da interação entre o professor, aluno e a aprendizagem, por meio de recursos e processos alternativos de comunicação, que viabilizam a expressão. Desta forma, a linguagem passa ser interpretada como uma atividade constitutiva, social, que se constroi e re constroi a cada vez, na atividade da linguagem, onde o aluno se constitui na interação com os outros e esta interação se dá no interior de um contexto social e histórico.
A comunicação implica em buscar contato, entendimento, compreensão. É através dela que as pessoas transmitem seus sentimentos e ideias. Ela “ocorre porque engloba o pensamento, a linguagem, a fala e os afetos e, socializa o pensamento que tem sua origem na motivação e inclui inclinações, necessidades, interesses, impulsos, afeto e emoção”. (BRASIL, p. 38).
“Antes de ser para a comunicação, a linguagem é para a elaboração; e antes de ser mensagem, a linguagem é a construção do pensamento; e antes de ser veículo de sentimentos, idéias, emoções, aspirações, a linguagem é um processo criador em que organizamos e informamos nossas experiências”. Franchi (apud MASSI, 2001, p 22).
Vigotsky; Bakhthin (apud , FREITAS, 1994, p.123) “Considerou que o fato linguístico não pode ser entendido apenas como uma realidade física, mas que seria necessário inseri-lo na esfera social, para tornar-se um fato de linguagem, compreendendo como indispensáveis a unicidade do meio social e a do contexto social”.
São nas relações sociais que as pessoas se constituem, são marcadas pelas palavras, pelos gestos dos outros, e os outros os cercam também com suas atitudes. (VYGOTSKY, 1998). Essa visão atribui importância à dimensão social e as relações do aluno com o mediador e com o meio em que está inserido.
Partindo desse pressuposto, postula a existência de dois níveis de desenvolvimento infantil, o real e o potencial. O real corresponde à capacidade apresentada pela criança de realizar suas atividades de modo independente, já o potencial, a criança necessita da ajuda do outro para realizar algumas atividades (LÚRIA, 1988).
Nesta perspectiva surge, o professor e o seu importante papel de mediador, interferindo, instigando o aluno em seu processo de aprendizagem e desenvolvimento do potencial. Não se pode esquecer o quão importante é a mediação do professor no aspecto do desenvolvimento da linguagem.
O desenvolvimento dessa linguagem não ocorre da mesma forma, nem no mesmo tempo para todos: fatores hereditários, condições orgânicas e a estimulação oferecida pelo meio são fatores variantes dessa linguagem.
De acordo com Nunes (2003), 65% das crianças com sequelas de Paralisia Cerebral têm dificuldade ou até incapacidade absoluta de mover o aparelho fonoarticulatório, de forma a produzir qualquer palavra inteligível.
Sabe-se que a comunicação, não se restringe à fala e à escrita. Apresentamos recursos verbais e não-verbais que nos permitem interagir. Quando falamos, podemos nos utilizar das expressões faciais e dos gestos, que enfatizam e dão expressão à fala; indicamos objetos e pessoas ou nos valemos de um aceno de despedida, de um balançar negativamente com a cabeça, para dizer o não e também de outros gestos socialmente utilizados que complementam nossa mensagem.
Existe um elemento de extrema importância, que se negligencia numa linguagem gestual que transcende a fala e as mãos, que é o olhar. Os olhos falam, transmitem sentimentos, se negam, recusam e aceitam.
Alunos com restrição na fala e escrita utilizam-se de expressões faciais e gestos para sua comunicação. A linguagem gestual para eles é um meio de expressão com diferentes formas utilizadas para transmitir o seu pensamento que exige para quem ouve, uma forma diferente de escutar (BRASIL, 2002). As diferentes formas são concebidas como “as oportunidades que são criadas para que a linguagem se realize e se constitua significativamente, revelando a subjetividade do sujeito” (MASSI, p.7).
Pode-se dizer que a comunicação entre as pessoas é marcada e complementada por vários elementos comunicativos que permitem compreender o outro e, também, ser compreendido. (BRASIL, 2002, p, 3).
Há alunos que, embora apresentando elevado nível de compreensão receptiva da linguagem, evidenciam dificuldades acentuadas na fala e/ou na escrita, necessitando, para sua interação, do uso de outras formas de sinalização e códigos, aqui denominados de comunicação alternativa, utilizados como meios determinantes para o processo ensino-aprendizagem.
A expressão Comunicação Alternativa e/ou Suplementar vem sendo utilizada para designar um conjunto de procedimentos técnicos e metodológicos direcionados às pessoas acometidas por alguma doença, deficiência, ou outra situação momentânea que impede a comunicação com as demais pessoas, por meio dos recursos usualmente utilizados, mais especificamente a fala (BRASI, 2004, p.4).
Outra expressão utilizada é a comunicação aumentativa, compreendida como outro meio de comunicação para complementar ou compensar fala, mas sem substituí-la totalmente. “E que comunicação é alternativa quando utiliza outro meio para se comunicar ao invés da fala, devido à impossibilidade de articular ou produzir sons adequadamente”. (TETZCHNER; MARTINSEN; apud SHIRMER, et al, 2007, p. 58).
O termo Comunicação Alternativa e Ampliada é utilizado para definir outras formas de comunicação como o uso de gestos, expressões faciais, o uso de pranchas de alfabeto ou símbolos pictográficos, até o uso de sistemas sofisticados de computador com voz sintetizada (VON TETZCHNER e MARTINSEN, 2000).
Alguns autores ressaltam que o termo Comunicação Alternativa não pode ser confundido como um recurso que irá substituir a fala, mas uma comunicação de suporte, um apoio complementar e/ou suplementar à fala, que contribua para que a comunicação aconteça, para que o aluno possa ser compreendido. (BRASIL, 2004).
A comunicação é considerada alternativa, quando o indivíduo não apresenta outra forma de comunicação e, considerada ampliada, quando o indivíduo possui alguma comunicação, mas essa não é suficiente para suas trocas sociais. A Comunicação Alternativa oportuniza a ele, participar das aulas indicando ao professor o que aprendeu, externando suas dúvidas e anseios, debatendo assuntos pertinentes e de seu interesse.
Os pesquisadores e estudiosos dessa área nos apontam dois caminhos para a comunicação: a comunicação apoiada e a comunicação não apoiada.

A comunicação apoiada englobaria todas as formas de comunicação que possuem expressão lingüística na forma física e fora do corpo do usuário, como objetos reais, miniaturas de objetos, pranchas de comunicação com fotografias, fotos e outros símbolos gráficos e, ainda, os sistemas computadorizados. Esses são os recursos adaptados. A comunicação não apoiada englobaria as expressões próprias daquela pessoa, tais como os sinais manuais, expressões faciais, movimentos corporais, gestos, piscar de olhos para indicar “sim” ou “não”. Esses são os recursos da própria pessoa. (BRASIL, 2004, p.5-6).

            Exemplificando as formas de comunicação citadas, temos, atualmente, alunos que fazem uso desses recursos por meio de computadores, nos quais os teclados são adaptados, com diferentes configurações e recursos que ampliam as possibilidades dos usuários, principalmente daqueles que utilizam outras partes do corpo para o acesso.
            Outro recurso disponível, que auxilia o professor no processo de ensino e de aprendizagem, é a Prancha de Comunicação que possibilita ao aluno expressar o conhecimento adquirido, bem como ampliar as formas de comunicação com seu interlocutor. A utilização da prancha não se restringe apenas ao contexto escolar, podendo também ser utilizada nas relações sociais.

A Prancha de Comunicação é um recurso para transmitir as mensagens, construídas com objetos reais, ou símbolos, gravuras, fotos, letras, sílabas, palavras, frases ou números. São personalizadas e devem considerar as possibilidades visuais e motoras de seu usuário. (NUNES, 2003, p.219).

            No processo de construção da prancha, vale salientar que a participação do aluno é fundamental na escolha dos variados materiais que irão fazer parte da mesma, relacionando forma, tamanho, textura, cor, peso, identificados por símbolos, que são as representações visuais, auditivas ou táteis de um conceito, letras, gravuras, sílabas, palavras, frases, entre outros. Os materiais deverão ser pré-selecionados, de acordo com a necessidade imediata de comunicação, pertinentes aos conteúdos a serem desenvolvidos e aos objetivos propostos. Correlacionando, podemos dizer que a prancha é para o aluno uma espécie de caderno; e os símbolos e letras, podem ser comparados à escrita usual.
            No uso da prancha, para se comunicar, alguns alunos conseguem realizar a manipulação dos materiais; já, outros, necessitam do apoio do interlocutor para sua realização. Ao se comunicar, o aluno poderá olhar, piscar, apontar, sorrir, gesticular, ou outros, de acordo com sua condição motora ou capacidade funcional.       A Prancha poderá estar fixada na carteira do aluno, num flanelógrafo, num suporte sobre a carteira, em forma de avental, usado pelo professor regente e/ou de apoio, de preferência em um local, ao alcance visomotor do aluno.
O desafio para os professores envolvidos na escolarização do aluno vai além de estabelecer a interação da linguagem escrita e oral, é também o de estimular o acesso ao letramento. (Marisa Bispo Feitosa,2012) By Lully.

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